Com base na minha experiência de mãe adotiva de uma criança de 11 anos (época da adoção), quero alertar a todas as mães adotivas do direito à licença maternidade. Por ser servidora pública estadual me foi negada a licença ao fundamento de que, considerando a idade da criança, não existia amparo legal na legislação para trabalhadoras em regime estatutário.
A licença maternidade é um direito fundamental, tanto do adotante quanto do adotado. Não é justo, nem democrático a impossibilidade do benefício às servidoras públicas, ferindo o princípio da igualdade que está na Constituição Federal. Inconformada, procurei meus direitos na justiça, e um ano e seis meses depois me foi concedida a licença maternidade de 120 dias pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
O tempo de espera para a mãe adotiva chega, muitas vezes, a durar anos. Sem data prevista e sem a presença do filho, a mãe se prepara para receber uma criança que ela idealiza, diferentemente da mãe gestante que tem nove meses para construir, porém junto com o filho gerado, os laços afetivos de mãe e filho.
Ao findar esse tempo, a mãe adotiva leva para casa seu filho, na maioria das vezes diferente do idealizado. Mas um menino ou menina que já tem uma história, um passado repleto de inseguranças e perdas. Uma criança ou adolescente que precisa ser acolhida e aceita em sua integridade, com sua beleza e originalidade, mas também com suas limitações e dificuldades.
Mãe e filho precisam ainda conquistar um ao outro para construírem juntos, o vínculo materno-filial. Essa construção não acontece como num passe de mágica, ela requer um tempo para se conhecerem. É neste tempo de adaptação que surgem as dificuldades e os desafios que uma adoção implica. Cada adoção tem uma trajetória única e singular, porém são observados comportamentos que são comuns, principalmente em casos de crianças maiores e adolescentes.
Assim, nessa relação entre pais e filhos podem surgir comportamentos regressivos da criança, agressividades, atropelamento de etapas na construção do vínculo de filiação, manifestações de emoções intensas, entre outros. Comportamentos esses, que muitas vezes podem afetar a construção da relação afetiva de ambos os lados.
Para construir uma relação saudável, a mãe precisa detectar e aprender a lidar com essas situações, ao mesmo tempo mantendo atitudes firmes e impondo limites, sempre com muita paciência, compreensão, renúncia e amor. A construção do vínculo e sua consolidação é uma conquista mútua e diária, principalmente no período de adaptação. Faz-se necessário a presença da mãe em tempo integral, independente da idade da criança na época da adoção.
Mas como não deixar a criança sob os cuidados básicos de terceiros, nesse período de adaptação, se é vedado à mãe o direito à licença maternidade quando esta é servidora pública do regime estatutário?
A legislação estadual em vigor, art. 59 da Lei no 3.150/2005, em conformidade com a legislação federal, art. 392-A da Lei nº 10.421/2002, assegura licença maternidade às mães adotivas de acordo com a idade da criança: 120 dias se ela tiver até um ano; 60 dias de 1 a 4 e 30 dias de 4 a 8 anos. Mas, não satisfaz a plena igualdade entre trabalhadoras, a que rege a Constituição Federal, já que concede um período menor à adotante do que o concedido à gestante e, ainda, nega a licença se a criança possuir mais de 8 anos.
Já a Lei nº 12.010/2009, revoga o artigo 392-A e garante às trabalhadoras em regime celetista a licença maternidade de 120 dias, independente da idade da criança. A lei avança, porém, ainda contraria os fundamentos constitucionais ao não conceder licença às trabalhadoras em regime estatutário.
A ausência de lei estadual não pode ser um entrave à concretização do direito fundamental da mãe e da criança só porque aquela se encontra regida pelo regime estatutário e não pelo celetista.
Resta-nos, como mães adotivas, buscarmos nossos direitos e clamarmos aos legisladores mudanças dessa anomalia na lei, a fim de dar amparo à concessão da licença maternidade também para as mães adotivas que são servidoras públicas.
Neste artigo, não faço referência ao pai ou qualquer outro membro da família adotante, simplesmente pelo fato de que a licença maternidade é concedida à mãe. Sem com isso, desprezar a necessidade e o direito à licença paternidade quando a criança é adotada apenas por um pai ou no caso de casais homoafetivos.
*Maristela Missio é Professora da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e membro do GAAD - Grupo de Apoio á Adoção de Dourados Acolher
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